domingo, 16 de setembro de 2012

"A MEMÓRIA É A CONSCIÊNCIA INSERIDA NO TEMPO"


De:
Região em Notícias de Campo Maior
N.º 238 - IV Série - Ano IX
23 de Novembro de 2007

   "O provedor da Santa Casa da Misericórdia de Campo Maior (SCMCM), João José da Rosa Carrilho, decidiu pôr fim ao mandato que o ligava à Misericórdia de Campo Maior assim como todos os corpos gerentes daquela instituição. João Carrilho, engenheiro agrónomo, assumiu o cargo de provedor da SCMCM no ano de 1987, sendo que se encontra ligado a essa Misericórdia há 27 anos.
   Em entrevista ao Região em Notícias (RNCM), o provedor demissionário referiu todo o percurso que efectuou ao serviço da Misericórdia de Campo Maior, o qual menciona todos os projectos que foram criados durante a sua passagem por aquela Misericórdia.
   João Carrilho iniciou o seu discurso começando por dizer que a tomada de posse na SCMCM ocorreu no dia do baptizado do seu filho João Pedro e por convite do provedor da altura para integrar a nova mesa administrativa que iniciava a actividade em 1981, "eu nunca tinha estado ligado à Misericórdia e não sabia o que eram as Misericórdias, mas eu aceitei integrar um lugar de simples vogal por razões de afectividade que eu mantinha com a pessoa que me fez o convite e também porque estava em início da minha vida profissional", contou João Carrilho.
   Na altura em que João Carrilho entrou para a Misericórdia de Campo Maior (1980) estava em curso o processo do Lar de Santa Beatriz, mas, segundo o provedor demissionário, também estava em curso "as alterações, as designações e as filosofias de suporte às futuras valências". Grande parte das valências destinavam-se à terceira idade, sendo que o Lar de Santa Beatriz começou por ter a designação de Asilo de santa Beatriz, estando ainda conservado na Quinta de S. Pedro um azulejo que comprova que o edifício outrora era um asilo. Em 1981, a Misericórdia de Campo Maior tinha um Lar de Terceira Idade, que também se designava por Santa Beatriz, onde existia uma camarata para os homens, e também existiam uns quartos onde era necessário passar para outros quartos com senhoras, cuja capacidade suportava 45 utentes, existindo dois funcionários administrativos. Na generalidade, a Misericórdia de Campo Maior continha 12 trabalhadores nessa altura.
   Na altura em que o provedor entrou na Misericórdia de Campo Maior, a mesma não mais nenhuma actividade, sendo que apenas tinha as suas propriedades rústicas todas arrendadas, inclusive a Quinta de S. Pedro também estava arrendada. A única actividade que a Misericórdia tinha era o Lar de Santa Beatriz. No ano de 1985, iniciara-se a construção do Centro de Dia Betânia no chamado Jardim das Viúvas, onde está situado o Jardim da Avenida. A partir desse momento, a Misericórdia Local passou a gerir esse serviço na sequência de um acordo celebrado com a autarquia de Campo Maior, uma vez que o edifício onde se encontra o Centro de Dia Betânia é propriedade da Câmara Municipal de Campo Maior, o qual fora construído para apoiar a população idosa. Segundo João Carrilho, "`medida que vamos conseguindo ter respostas vamos tendo a consciência de que as respostas que nós vamos criando não são suficientes, não são as mais adequadas e não correspondem às expectativas dos cidadãos. Portanto, nós vamos tendo a noção de que é necessário pensar todos os dias sobre aquilo que devemos fazer no futuro, porque as Misericórdias, tendo o espírito universalista e tendo um carácter universal, devem procurar corresponder às expectativas das populações, principalmente das pessoas mais carenciadas", explicou, onde adiantou que "o Lar Santa Beatriz é hoje encarado como um fio de linha, porque quando não há mais nada há o Lar. O Centro de Dia era uma valência que estava construída antes do Lar, mas, de facto, o que as pessoas desejam é manterem-se nas suas residências e nós tivemos essa consciência porque desde sempre começámos a dedicar alguma atenção à análise da realidade social para nós percebemos, porque nós só podemos intervir quando compreendemos a evolução da sociedade e quando a conhecemos", referiu.
   Apesar do provedor recém-demissionário ter pouco tempo disponível, certo é que João Carrilho se foi interessando pelas questões sociais, até porque, segundo João Carrilho, "os agrónomos também têm formação social e há grandes sociólogos na área da engenharia.", realçou, tendo mencionado o engenheiro Bruto da Costa como exemplo, o qual é, actualmente, o presidente do Conselho Económico e Social, sendo que também se encontra formado na área da engenharia, para além de outros engenheiros que se dedicaram à área da sociologia e das questões sociais. Nessa altura, os corpos gerentes da Misericórdia concluíram que com a implementação do Lar e do Centro de Dia as pessoas afirmavam que desejariam permanecer em suas casas. "Em relação a esse aspecto, a Misericórdia de Campo Maior foi muito pioneira, pois foi das primeiras Misericórdias a instalar os serviços de apoio domiciliário que funcionam desde 1987 com o apoio inestimáveis da Fundação Calouste Gulbenkian que ofereceu a primeira viatura à Misericórdia de Campo Maior e, a partir daí, nós começámos, então, com o Apoio Domiciliário no ano de 1987", confessou João Carrilho.

   Recuando um pouco no tempo, a Misericórdia de Campo Maior implementou o Jardim-de-Infância O Despertar na vila de Campo Maior no ano de 1983, o qual constituiu o suporte jurídico entregue à Misericórdia por decisão governamental, sendo, posteriormente, executado pelo Centro Distrital de Segurança Social de Portalegre. "Não existia nenhum apoio às famílias em termos de infância. Na idade pré-escolar, as crianças desde o seu nascimento até à entrada para a escola primária estavam praticamente desguarnecidas em Campo Maior e, por isso, a Misericórdia aceitou o repto e o desafio do Governo e do Centro Regional de Segurança Social, tendo assumido o suporte jurídico para garantir o funcionamento do Jardim-de-Infância O Despertar com a valência creche dos três meses aos três anos e, depois, a que se chamava o infantário", apontou João Carrilho, o qual recordou que aquele jardim-de-infância "teve dois sobressaltos resultante da evolução das políticas públicas e da evolução da sociedade. O primeiro sobressalto prende-se com a criação da rede do ensino pré-escolar terminada na segunda metade dos anos noventa quando foi criada a rede do ensino público pré-escolar, onde houve dois anos de diminuição significativa da frequência das crianças em idade pré-escolar. Mas o ensino público, sendo gratuito, retirou muitas crianças do nosso jardim-de-infância. Como o ensino público somente tinha cinco horas diárias não dava resposta aos casais que necessitavam do apoio social porque trabalhavam, nomeadamente antes das 9 horas, durante o período do almoço e a partir das 15:00 horas". A procura dos serviços da Misericórdia recuperaram desse abaixamento da procura dos serviços e, em seguida, houve um período em que a Misericórdia esteve em plena utilização das capacidades instaladas. Há dois anos atrás, por decisão deste Governo, e com o prolongamento de horário, registou-se uma baixa significativa da frequência do jardim-de-infância, conforme referiu João Carrilho, "existe um abaixamento significativo e nós tivemos nos dois últimos anos lectivos o equivalente a ter uma sala fechada e isso causa transtornos brutais e é um impacto negativo brutal em termos financeiros, sendo que talvez os mais prejudicados sejam as crianças as quais não poderão beneficiar dos serviços da Misericórdia, mas em relação a isso um dia farão história", frisou. Porém, João Carrilho está convencido que o jardim-de-infância O Despertar da vila de Campo Maior  "tem condições ímpares para ser o melhor jardim-de-infância e corresponder às expectativas dos pais e às necessidades das crianças. A realidade mostra que os serviços da Misericórdia de Campo Maior estão pelo terceiro ano consecutivo com uma redução significativa na sua utilização sobretudo devido ao prolongamento de horário no pré-escolar oficial e também porque, em termos institucionais, a Misericórdia de Campo Maior não tem conseguido atrair os pais das crianças a colocar os seus filhos naquele estabelecimento educativo. Relativamente a essa questão, João Carrilho afirmou que "os pais somente colocarão os seus filhos no Jardim-de-Infância O Despertar se nós, em termos de profissionalismo, conseguirmos demonstrar aos pais que os serviços da Misericórdia são inigualáveis e que vale a pena pagar para que os seus filhos tenham uma educação de um nível bastante superior aos outros estabelecimentos de ensino. Isso é uma tarefa de futuro, do presente, mas também será para o futuro de quem estiver na Misericórdia de modo a poder dar este salto para que, como é minha profunda convicção, se possa prestar os serviços que a população deseja e as crianças necessitam", disse.
   Na altura em que João Carrilho assumiu o cargo de provedor da santa Casa da Misericórdia de campo maior, os corpos gerentes daquela Misericórdia verificaram que aquilo que havia em termos de equipamento social e de edifícios já não era minimamente satisfatório e já não correspondia ao que os utentes desejavam nem às orientações técnicas que vinham sendo divulgadas ainda sem grande obrigatoriedade. Devido a esse facto, a SCMCM, juntamente com a Mesa Administrativa da altura, tomou a iniciativa de remodelar e ampliar o Lar de santa Beatriz. Após várias conversas com o presidente da autarquia de Campo Maior da altura, juntamente com o Governador Civil e com o presidente do Centro Regional de Segurança Social, a SCMCM iniciou as obras daquele lar de idosos no ano de 1988. "A Misericórdia não tinha recursos financeiros nem nunca teve, pois investe sempre tudo em prol das pessoas mais necessitadas e, portanto, também não é missão da Misericórdia ter muito dinheiro disponível. Então, nessa altura, e face às conversas que havia, a Misericórdia disponibilizou o terreno, e a autarquia disponibilizou o projecto, sendo que a segurança social pagou a obra e foi desse modo que começámos a obra que estava previsto ser construída durante 660 dias" explicou João Carrilho. A obra foi, contudo, entregue no ano de 1996 devido a razões que se prendem com atrasos na execução da obra derivado à impossibilidade do empreiteiro cumprir os prazos, "mas nós fizemos sempre um esforço para tudo facilitar", apontou. A primeira fase do Lar tem 15 anos de funcionamento e está a chegar ao final da sua vida útil. Para o provedor demissionário, a Residência Santa Beatriz encontra-se obsoleta e "tem de se pensar em remodelá-la, porque, primeiro, já não corresponde àq filosofia moderna de apoio à terceira idade e por esse mesmo motivo necessita de uma profunda remodelação. Actualmente, os quartos estão desactualizados, mas, na altura, era o mais moderno que havia e é preciso termos noção da evolução da sociedade e da rapidez com que tem evoluído. O projecto tem vinte anos e, portanto, o mesmo foi idealizado de acordo com aquilo que era aconselhável e recomendável, mas, nos dias de hoje, nós não podemos pensar em ter quartos que não tenham casa de banho. Tirando os quartos de casal e os quartos individuais, todos os restantes quartos não têm casa de banho e isto é impensável", contou João Carrilho sobre aquela residência, onde adiantou que existem colunas no meio do corredor e, hoje, com o problema da dependência, porque para a residência vêm os idosos com o mais elevado nível de dependência, e com as colunas no meio dos corredores não é possível circular com camas articuladas ou macas. Portanto nós vamos, agora, instalar um elevador novo porque o que está feito é para cadeiras de rodas e na altura em que tudo isto foi projectado, os lares projectavam-se para pessoas autónomas. A realidade social evoluiu e hoje, provavelmente, mais de 89 % da nossa população residente no Lar está com elevadíssimos graus de dependência, muitos deles com dependência total", referiu. João Carrilho aproveitou para salientar que a vila de Campo Maior necessita de uma nova residência, "nessa altura, e apesar de o Lar ter somente 15 anos de funcionamento, tem de se pensar que Campo Maior necessita de uma nova residência e a Misericórdia de Campo Maior terá de pensar em remodelar esta ou, eventualmente, pensar em fazer o que se fez há 20 anos", recomendou.
   Quando o Lar se encontrava na sua primeira fase do período de ultimação, certo dia a SCMCM encetou uma conversa com o Governador Civil, cujo teor da conversa fazia referência ao problema da toxicodependência, tendo o Governador Civil aproveitado a ocasião para referir que existia um problema grave por todo o distrito em relação à toxicodependência. Nós não tinhamos nenhuma resposta para os toxicodependentes no distrito de Portalegre e necessitávamos criar isso. O Governador Civil de Portalegre disse que somente a Misericórdia de campo Maior poderia pegar na questão do apoio aos toxicodependentes e essa instituição era a Misericórdia de Campo Maior. Eu fiquei surpreendido, porque nós sabemos o que se passa em termos de toxicodependência em Campo Maior. Nós estamos perfeitamente conscientes da realidade, quer em termos quantitativos quer em termos qualitativos", referiu João Carrilho, o qual afirmou que "apesar da questão da toxicodependência ser uma área da saúde e as Misericórdias terem essa vocação, já que uma das obras da Misericórdia é curar os doentes, eu perguntei ao Governador Civil do que é que constava o projecto e ele disse-me que falaria um dia mais tarde comigo. Aquilo ficou a moer o meu espírito e, passados dois anos, eu convidei o Governador Civil para vir à inauguração da Comunidade Terapêutica Reencontro. Foi assim que em 1994 nós começámos a apoiar e a tratar toxicodependentes na Quinta de São Pedro", contou.
   Em 1995, com o apoio dos Quadros de Comunidade de Apoio e com o apoio do Instituto de Empregoe Formação Profissional, a SCMCM começou a ser orientada para as questões da formação, quer do ponto de vista externo, como do ponto de vista interno. Relativamente a esse tema, João Carrilho começou por adiantar que a SCMCM começou por analisar o peso bem como a dificuldade do trabalho nas diferentes valências daquela Misericórdia, nomeadamente nas valências da terceira idade assim como da Residência, "a nossa Misericórdia começou também a ter uma maior consciência das responsabilidades que estavam a ser pedidas aos serviços com as novas exigências em termos de cumprimento de formalidades e de apresentação de documentação. As exigências têm vindo a aumentar assustadoramente nos últimos quinze anos e nós sentimos necessidade de formar os nossos recursos humanos", apontou, tendo ainda referido que a formação seria realizada de uma forma permanente, correspondendo, desse modo, ao desafio governamental o qual visava promover a formação para o exterior, sendo que, na altura, não existia nenhuma entidade em Campo Maior que realizasse a formação. A SCMCM deu formação a muitos campomaiorenses, sendo que uma grande percentagem conseguiu obter emprego. Porém João Carrilho, admite que não gosta de utilizar a expressão "formar ignorantes", pois prefere dizer que nóe ensinamos quem não sabe", uma vez que essa expressão não é tão violenta para o provedor que agora termina funções. A SCMCM criou o sector de formação dentro do espírito de cumprimento das obras da Misericórdia, o qual tem vindo a ser ampliado. Por desafios externos, nomeadamente com o director do Centro de Emprego e com os directores dos centros de formação de Portalegre e de Évora, a SCMCM implementou algumas escolas de oficina das quais resultaram formações nas áreas da pintura e da cerâmica, tendo daí resultado a criação do Artesanato de São João e que ainda se encontra de pé. "Na nossa perspectiva, o Artesanato de São João é um trabalho meritório e que está em condições de poder ser viável. Este ano terminou o período dos sete anos enquanto empresa de inserção e, portanto, nós deixamos tudo encaminhado para a viabilização total do artesanato e ele, de facto, tem viabilidade. Nós já demonstrámos que o projecto tem viabilidade técnica e económica, sendo que a viabilidade financeira é o último passo que falta garantir no futuro assim como para a sua manutenção em termos de postos de trabalho", salientou João Carrilho sobre aquela instituição de artesanato, tendo o mesmo referido que o aspecto da empregabilidade "também é obra da Misericórdia", o qual se manifesta através da "criação de emprego e a salvaguarda do património cultural e dos valores tradicionais da nossa sociedade", sublinhou.
   O projecto ra rádio surgiu no final da década de 90, tendo a SCMCM proposto a sua candidatura à Irmandade e a qual foi aceite. A Misericórdia de Campo Maior cocorreu ao projecto da rádio porque, segundo João Carrilho, "não havia nenhuma outra entidade na vila de Campo Maior que concorresse ao alvará da rádio. Eu creio que foi a única actividade em que houve unanimidade de todos os irmãos, pois todos os irmãos apoiaram a ideia da rádio. A unanimidade foi tão grande e tão consciente que não houve um único irmão que rejeitasse o apoio à rádio, porém, bastava um irmão rejeitar o projecto da rádio para que ná fosse atribuído o alvará do projecto da rádio à Misericórdia", referiu. A rádio designou-se por Rádio Campo Maior (RCM) e, na opinião de João Carrilho, " a rádio tem prestado um serviço notável à divulgação da cultura e à aproximação das pessoas, enfim, tudo aquilo que compete uma rádio local fazer. A rádio foi bem aceite pela população de Campo Maior e só não comete erros quem não faz nada e é natural que a rádio tenha alguns erros mas também devemos ter consciência da dimensão da rádio", frisou, não deixando de referir que "mesmo as rádios profissionais do mais alto gabarito técnico e de recursos humanos, eventualmente, também cometerão erros". O projecto da rádio iniciou-se de acordo com o espírito da Misericórdia da Comissão, visto a rádio ser um projecto no âmbito da cultura e isso "está escrito no compromisso desde a origem de todas as Misericórdias do país, as quais têm um património cultural que convém salvaguardar. E as rádios e os órgãos de comunicação social podem desempenhar essa missão", esclareceu João Carrilho, o qual crê que a rádio "consiga combater um pouco a exclusão social, uma vez que ela chega à casa das pessoas", uma vez que há muitos idosos que têm medo da noite, especialmente no Verão, sendo que alguns idosos passam a noite acordados com medo de que lhes possa acontecer alguma coisa", apontou. Existem, porém algumas rádios que dedicam duas a três horas de emissão aos idosos e, de acordo com esse facto, o provedor demissionário referiu que desejaria ter criado um programa desse género, "nós gostaríamos de ter feito esse programa no âmbito do projecto Renascer a Esperança, sendo que agora virá aí uma fornada de projectos. Um desses projectos é um projecto de apoio à pessoa idosa e se um dia alguém desejar realizar, creio que é uma ideia bonita, se é realizável ou não, o certo é que até ao momento não tem sido possível realizá-lo", salientou.
   O provedor que agora vai deixar de assumir as suas funções naquela instituição de solidariedade social não deixou de mencionar o projecto "Renascer a Esperança", tendo referido que esse projecto "é um projecto pioneiro no nosso país, mas, agora, já existem alguns programas desse tipo na televisão e nas rádios", disse. João Carrilho teve conhecimento de que o Montepio Geral está, neste momento, a começar a criar a Tele-Assistência, sendo que esse serviço já se encontra implantado na SCMCM há mais de dois anos. "Nós conseguimos estar na frente de instituições de uma dimensão económica e financeira como a do Montepio Geral. Também temos um gabinete de apoio às pessoas idosas, porque nós temos consciência que há muitas pessoas que vão ficando isoladas e não têm consciência de que estão isoladas. Nós encontrámos inclusivamente pessoas que já pensávamos que tinham falecido", referiu, o qual sublinhou que o projecto "Renascer a Esperança" tem transmitido aos idosos "o convívio social e psicológico, sendo que se tem transmitido bem estar. A vila de Campo Maior recebeu a primeira viatura com um elevador eléctrico para transportar especialmente pessoas idosas que se movimentam em cadeiras de rodas. "Temos feito um trabalho muito discreto, mas muito eficaz, o qual muito tem contribuído para o bem estar da população. As pequenas obras de adaptação nas casas onde tem sido possível melhorar as acessibilidades. Há casos de pessoas que estão em cadeiras d erodas as quais não saiam à ruas nem aos pequenos quintais que têm e suas casas, porque os mesmos têm alguns degraus e os idosos não poderiama fazer obras em suas casas com pensões de 200 euros, sendo que nós conseguimos melhorar as suas casas com 500 euros. Também já melhorámos as acessibilidades e isso permitiu combater o isolamento e aumentar o nível de felicidade das pessoas, sendo que a Misericórdia de Campo Maior procura sempre que as pessoas atinjam o direito à felicidade. É função desta misericórdia garantir a felicidade das pessoas idosas e a instituição tem conseguido isso", apontou João Carrilho.
   Há uns anos atrás arrancou a Clínica de São Pedro, uma vez que em Campo Maior só existia o Centro de Saúde, sendo que o mesmo começava por fechar cada vez mais cedo e, nessa medida, era necessário criar um apoio diferente. A SCMCM  foi desafiada por dois médicos espanhóis que já se encontravam radicados em Campo Maior há alguns anos e os quais tinham de mudar as suas instalações. Desse modo, A SCMCM aproveitou a disponibilidade dos médicos com o desejo institucional de apoiar a população, porque é obra da Misericórdia curar os enfermos. A Clínica de São Pedro edificou-se e encontra-se, neste momento, em fase de mudança de instalações com o intuito de ficar com as suas instalações mais adequadas e de forma a que os médicos e os enfermeiros possam trabalhar em melhores condições em termos técnicos, assim como os doentes que queiram ter acesso à clínica possam também usufruir de melhores condições e de mais bem-estar. Relativamente à Clínica de São Pedro, João Carrilho referiu que a Misericórdia de Campo Maior está a ultimar as obras desse serviço e espera que a clínica fique pronta até final do ano.
   O jornal Região em Notícias de Campo Maior foi a última realização de projectos que a SCMCM teve nos seus estatutos. O jornal fez parte da Misericórdia porque, apesar de existir um director residente em Campo Maior, o jornal encerrou em Setembro de 2005, sendo que, em termos de gestão, existiu acolhimento por parte dos corpos gerentes da Misericórdia de Campo Maior em manter o jornal, tendo sido garantido o suporte financeiro para a sobrevivência do jornal. "O jornal é uma forma de aproximação dos campomaiorenses, sobretudo dos campomaiorenses que residem fora da região, os quais são muitas centenas. De facto, o jornal tem prestado um bom trabalho na aproximação dos campomaiorenses e tem-se garantido a sobrevivência financeira do jornal, sendo o mesmo mais um serviço que a Misericórdia presta aos campomaiorenses", contou João Carrilho.
   Por desafio do professor primário que se encontrava na escola de Ouguela por volta de 1994/95, num projecto que também envolveu a população de Ouguela, a SCMCM concedeu o suporte jurídico para o funcionamento do Centro Comunitário, uma vez que, na opinião de João Carrilho, "não havia nada que apoiasse a população muito envelhecida de Ouguela e esse Centro Comunitário foi objecto de financiamento  há alguns anos ao abrigo do segundo quadro Comunitário de Apoio e, desse modo, foi possível manter aquele Centro Comunitário", frisou. No entanto, existiram algumas dificuldades no financiamento, e ainda tem havido, mas, superados esses obstáculos, neste momento, encontra-se submetido ao parecer doCentro Distrital de Segurança Social de Portalegre um projecto para a reformulação das actuais instalações em instalações que possam ter a aprovação das novas instalações do Centro Comunitário sob o ponto de vista técnico. Esse processo encontra-se em apreciação no Centro Distrital e João Carrilho afirmou que "tem-se prestado um serviço notável à população de Ouguela, sendo que que não existe, actualmente, em Ouguela um único estabelecimento comercial nem existe nenhum café, e, portanto, o Centro Comunitário é o único serviço onde toda a população pode, verdadeiramente, usufruir dele, o qual tem o seu programa de actividades anual. A vila de Ouguela tem mantido alguma animação e há muitas actividades que, não sendo actividades próprias do Centro Comunitário, tem conseguido manter, como a matança do porco, os passeios de todo-o-terreno, quer em moto, a pé e em viaturas automóveis, assim como passeios pedestres, as caminhadas por todo o parque de São Mamede que forma feitas e terminavam em Portalegre", apontou.

   Por sua vez, o Clique Solidário também é um projecto para o qual a SCMCM apresentou uma candidatura, porque, segundo João Carrilho, "hoje em dia, o mundo global sem internet é muito menos global e, havendo a possibilidade de financiamento e havendo a possibilidade de disponibilizar para toda a população, quer formação básica na utilização dos computadores, quer o acesso à Internet, seria uma pena que nós, tendo conhecimento destas possibilidades, não pudéssemos utilizar esses recursos", afiançou. Actualmente, a SCMCM tem centenas de diplomas atribuídos a pessoas que receberam formação no Clique Solidário. João Carrilho, considera que "vale a pena apostar na continuidade do Clique Solidário, com este ou com outro nome, porque basta ouvirmos as pessoas que o têm utilizado para sabermos o quanto satisfeitas estão por poderem usufruir deste serviço. Inclusivamente, os beneficiários dos serviços da Misericórdia estão muito satisfeitos com este serviço, pois eles imaginaram comunicar com algumas pessoas de família no Luxemburgo, em Bruxelas, ou em Lisboa, por vezes, até vêem os familiares com as webcams".
   A formação prestada às pessoas desde a infância até à terceira idade resulta da obrigação institucional da Misericórdia, pois é sua missão ensinar aos que não sabem e, devido a isso, a SCMCM apostou nessa vertente. No parecer de João Carrilho, "o centro RVCC é um serviço notável que a Misericórdia está a prestar a Campo Maior, porque não existe uma outra entidade em Campo Maior que certifique as competências a nível do 4º, do 6º, do 9º e, agora, também do 12º Ano de escolaridade. Não havendo uma outra instituição que pudesse dar formação, seria lamentável que a Misericórdia não disponibilizasse este serviço para os campomaiorenses, uma vez que era sua obrigação fazê-lo", anotou. Daí a Misericórdia de Campo Maior ter abraçado o projecto do Centro das Novas Oportunidades, porque não existia mais nenhuma instituição em Campo Maior que estivesse habilitado para o fazer. Até ao momento, a SCMCM já certificou muitos indivíduos até ao 9º Ano de escolaridade, sendo que já existe cerca de centena e meia de pessoas a pedir a certificação ao nível do 12º Ano de escolaridade. "Isto é o trabalho mais recente, e mais notável, que foi feito em Campo Maior em termos de formação. Foi uma possibilidade que este Governo criou e não nos compete a nós discutir se o Governo fez bem ou mal. A nós compete-nos, enquanto instituição, disponibilizar aquilo que em termos de políticas públicas é definido para o nosso país. O Governo entendeu criar estes Centros de Novas Oportunidades, e criar toda a regulamentação e toda a legislação necessária para o reconhecimento e validação de competências. Portanto, era uma pena que os campomaiorenses para poderem beneficiar desse serviço tivessem que se deslocar para uma outra instituição, sendo que o mesmo permite a elevação do nível académico dos cidadãos de Campo Maior", explicou João Carrilho. Como o trabalho realizado pelas profissionais foi de tal ordem relevante, a SCMCM viu-se obrigada a realizar a validação e o reconhecimento de competências fora da vila de Campo Maior, como em Degolados e Arronches, assim como em algumas freguesias de Arronches, Portalegre, Estremoz, Elvas e Alandroal.
   Um dos mais recentes projectos desenvolvidos pela SCMCM é a denominada Universidade Sénior, a qual resulta do projecto Renascer a Esperança. João Carrilho referiu que a vila de Campo Maior há muito tempo que sentia a necessidade de um espaço cultural, "há muito que nós vinhamos sentindo que faltava um espaço verdadeiramente cultural em Campo Maior, o qual fosse simultaneamente resultado de uma nova política europeia e que é a aprendizagem ao longo da vida. Portanto, para aquela população idosa que acha que tem alguns testemunhos a transmitir, e  a qual acredita na vida eterna considerando a morte como um momento de transformação, a aprendizagem decorre até ao momento da transformação. A pensar nessas pessoas, nós encontrámos um grupo que se responsabilizasse por esta Universidade Sénior, dentro do espírito do projecto Renascer a Esperança", contou.
   Com todas essas actividades de que a SCMCM dispõe nos dias de hoje, o provedor demissionário não deixou de frisar que "em termos de formação e qualificação, nós pegamos nas crianças mesmo antes do berço e levamo-los até à hora da sua transformação sempre em processo de  transformação, de aprendizagem e de qualificação. Nós temos creche, o Jardim-de-Infância, sendo que qualificamos o 4º, o 6º, o 9º e o 12º Anos de escolaridade, e temos também a Universidade Sénior que é um processo de aprendizagem ao longo da vida. Portanto, eu acho que a missão mais completa que nós hoje em dia temos na Misericórdia de Campo Maior é a formação e a qualificação para todos os indivíduos", realçou.
   Em relação ao Gabinete de Apoio à Pessoa Idosa (GAPI), João Carrilho afirmou que esse serviço "permitiu a realização de duas obrigações institucionais", sendo que a primeira obrigação se refere ao cumprimento do objectivo da doação, porque o edifício onde actualmente está instalado o GAPI foi doado à Misericórdia de Campo Maior pela família Botelho, tendo o senhor Martinho sido o grande impulsionador dessa doação como objectivo de se apoiar as pessoas idosas", salientou. Depois de pequenas obras de reparação, foi possível instalar o GAPI nesse edifício e, desse modo, cumpriu-se a obrigação institucional imposta pela família doadora, cujo edifício se deveria destinar ao apoio às pessoas idosas. "Isto está a ser muito bem cumprido, sendo que o prédio é antigo e tem imensas dificuldades. Apesar de a sua doação ter sido feita há mais tempo, não tinha, contudo, sido possível ter dado outra utilização, mas agora, a Misericórdia e a Irmandade, a qual sempre se prezou honrar os seus compromissos, está, desse modo, a cumprir o seu compromisso", realçou João Carrilho.
   Relativamente à Igreja da Misericórdia, a mesma encontra-se fechada ao público para prestar o culto. A Igreja encerrou depois do hospital se ter transferido do centro da vila para a Quinta de S. Pedro, sendo que depois do 25 de Abril a Igreja abriu para a realização dos velatórios, mas a qual já esteve várias vezes fechada porque é um edifício muito antigo. "Actualmente, a igreja encontra-se fechada na esperança de nós conseguirmos melhorá-la e dignificá-la. Numa primeira fase, foi já colocado e feito o novo adro da daquela igreja, sendo que falta colocar a porta porque nós não temos conseguido encontrar ninguém que faça essa porta. Também não tem sido possível registar todo o património da Misericórdia, o qual é diverso e basicamente não estava registado. Nós temos agora, uma jurista que está encarregue desse registo e que o mesmo se tem deparado com imensas dificuldades registar a Igreja", referiu João Carrilho. Como a segunda fase das obras exigem o registo da Igreja em nome da Santa Casa da Misericórdia de Campo Maior, não tem sido possível realizar a candidatura para a realização das obras interiores, nomeadamente o piso e o rodapé "que é uma zona muito celitrosa e temos um projecto que visa instalar o rodapé a negro, assim como melhorar as condições e dignificar a igreja para aquilo que a Irmandade entender por bem, a começar pelo culto da própria Irmandade, pois foi para isso que aquela igreja se edificou", anotou o provedor demissionário da SCMCM.

   Neste momento a Santa Casa da Misericórdia de Campo Maior emprega mais de uma centena de pessoas, sendo que na altura em que João Carrilho ingressou na Misericórdia o número de empregados ascendia a uma dezena. "Nós não criámos postos de trabalho por criar, pois nós criámos postos de trabalho sustentados e sustentáveis. É necessário uma dinâmica muito grande, muito forte, muito substantiva para garantir o funcionamento harmonioso da Misericórdia de campo Maior, porque não há nenhuma Misericórdia que tenha recursos próprios para tudo aquilo que é necessário fazer e que é desejável que se faça. Portanto,, compete aos seus dirigentes encontrar os recursos e numa busca permanente desses mesmos recursos, sejam eles de que natureza for,, de forma a melhorar o nível e a qualidade de vida dos cidadãos das comunidades onde estão instaladas", anotou João Carrilho, o qual assegurou que a Misericórdia de campo Maior é uma instituição do concelho e será sempre reflexo duma interacção da população com a sua própria Misericórdia. Portanto, nós temos criado esses postos de trabalho, os quais poderiam eventualmente ser mais. Se não tivéssemos devolvido os internatos de Portalegre e se não tivéssemos terminado com a Comunidade Terapêutica, nós, hoje, teríamos crescido 1500% em termos percentuais de emprego. Essa é também uma das missões da Misericórdia, ou seja, é ir ao encontro das necessidades das populações e, portanto, isto funciona tudo de forma harmónica, porque as necessidades de umas pessoas são desafios e são oportunidades para outras". O provedor que agora cessa funções adiantou ainda que "se nós aumentámos a capacidade da Residência Santa Beatriz e se nós melhorámos os serviços prestados aos idosos da Residência, do Centro de Dia e do Apoio Domiciliário, tudo isso foi uma oportunidade para os profissionais da Santa Casa da Misericórdia de Campo Maior. À medida que íamos aumentando e melhorando os serviços às pessoas que necessitam de serviços criados pela Misericórdia de Campo Maior, nós fomos aumentando e melhorando o nível de emprego das pessoas. Daí nós termos chegado a estes números com um aumento na ordem dos 1000%. Isso sempre foi feito de uma forma sustentada com projectos e com financiamentos significativos, os quais permitem que esta misericórdia tenha a dimensão que tem nos dias de hoje. E isto tem que ser uma busca permanente e constante do ontem, do hoje e do amanhã", realçou.
   Actualmente, em termos de funcionalidade e de operacionalidade, A Misericórdia de campo Maior "é uma  referência em termos de concelho, em termos de região, em termos de país e em termos até do mundo. Apraz-me registar que a Misericórdia de campo Maior é um modelo de referência para muitas outras Misericórdias em termos organizacionais e funcionais", garantiu João Carrilho, o qual acrescentou que "nós somos um modelo não apenas para outras Misericórdias, porque nós, por vezes por indicação dos serviços oficiais de outras instituições e outras entidades, somos procurados para ajudar a organizar e a operacionalizar em outras instituições, como é o caso de organizar dossiers pedagógicos de projectos, assim como servir os nossos regulamentos das várias valências para servirem de modelo para outras misericórdias, para outras instituições de solidariedade social. Apraz-me registar isso, porque nós conseguimos, de facto, transformar os desafios em oportunidades e ter sido, ao longo destas três décadas uma referência nas melhorias, não só organizacionais e funcionais da Misericórdia, como também pelo facto de ter contribuído para que outras instituições irmãs conseguissem, através da nossa fonte, melhorar os seus serviços", recordou.

"Doutrina da Igreja inspira Misericórdias portuguesas"

   João Carrilho reconhece que é importante contextualizar o funcionamento da Misericórdia de Campo Maior no tempo para se perceber a acção dessa instituição ao longo de três décadas, o qual afirmou que "a doutrina da Igreja é a grande fonte inspiradora das Misericórdias portuguesa. Por isso é bom que os dirigentes que se dedicam a estas causas tenham conhecimento da realidade doutrinal os quais a devem interiorizar profundamente de forma a que os actos que no dia-a-dia têm que praticar e as decisões que têm que tomar se enquadrem e estejam o mais coincidentes possíveis com essa doutrina", contou. Como tal, as Misericórdias funcionam para todo o mundo e para todas as pessoas, independentemente da sua raça, credo, religião e facção política. "As Misericórdias existem para estar no mundo e para prestarem serviços a todas as pessoas, desde logo, inspiradas nas sedes corporais das catorze obras de Misericórdia e nas sete espirituais", referiu João Carrilho, o qual adiantou que "Para ser dirigente de uma Misericórdia é necessário ter um espírito humanista muito enraizado no respeito pelos direitos humanos e pelos direitos de cidadania, logo, todos esses direitos têm de ser garantidos acima dos interesses da instituição, uma vez que a instituição em si não deve ter interesses", disse.
   O primeiro Encontro Internacional Das Misericórdias, que decorreu no ano de 1992 em Florença, a Sua Santidade o Papa João Paulo II, enumerou três princípios muito claros à Comunidade Católica, onde se inclui a opção preferencial pelos pobres, sendo que "a prioridade da nossa Misericórdia passa pelo atendimento aos pobres, assim como o destino universal dos bens materiais, como os bens espirituais. Por isso, quando nós estamos nestas instituições enquanto dirigentes, nós devemos dar preferência ao atendimento dos pobres, sendo que os pobres têm todos os direitos como todos os outros cidadãos" realçou João Carrilho, o qual salientou, acerca dessa questão, que "os nossos bens também são bens do universo e são bens de todos, que mais não seja, se nós não tivermos recursos financeiros para poder ajudar os outros, nós temos as nossas capacidades e os nossos conhecimentos, os quais devemos pôr ao serviço da comunidade. E também devemos ser no nosso dia-a-dia promotores duma nova civilização, que é a civilização do amor. Estes pontos são pontos importantes e é bom nós termos estes pontos sempre presentes para não nos esquecermos do rumo que temos que seguir".
   Recentemente foi publicado o novo compêndio da doutrina social da Igreja, onde existem dois pontos que fazem uma referência muito especial às chamadas organizações intermédias, das quais se incluem as Santas Casa da Misericórdia, independentemente da sua natureza e do país onde elas se situam, uma vez que são instituições de Igreja. João Carrilho apelou para o facto de que "todos nós termos de ler com muita atenção a carta encíclica de Sua Santidade o Papa Bento XVI, porque é um verdadeiro hino ao amor, e a segunda parte encíclica digamos que é a nossa Bíblia da acção do dia-a-dia. E vale a pena lê-la e reflectir muito sobre ela. Por último, eu também queria referir o discurso de Bento XVI aos bispos portugueses, o qual ocorreu muito recentemente", contou. Para além dos bispos terem reflectido sobre o discurso, João Carrilho afirmou que "todos nós devemos reflectir, principalmente num trecho importante, e que diz o seguinte: neste longo peregrinar a confissão mais frequente nos lábios dos cristãos foi a falta de participação comunitária, propondo-se encontrar novas formas de integração na comunidade. A palavra de ordem era e é `construir caminhos de comunhão´, sendo que é preciso mudar o estilo da comunidade eclesial e a mentalidade dos seus membros para se ter uma Igreja ao ritmo do Concílio Vaticano II, na qual esteja bem estabelecida a função do clero e do laicado, tendo em conta que todos nós somos um, desde quando fomos baptizados e integrados na família dos filhos de Deus. E todos nós somos corresponsáveis pelo crescimento da Igreja", divulgou João Carrilho, onde acrescentou esse facto "faz-nos meditar sobre qual é o nosso papel na Igreja e proque é que há tanta gente que não acompanha e que não vive a Igreja.E isto deveria fazer pensar aquelas pessoas que mais vão à Igreja e que mais acompanham a vida da Igreja. Isso é matéria suficientemente importante para não nos deixar indiferentes. Eu acho que vale a pena que todos reflictamos sobre o facto de haver uma diminuição significativa da frequência da eucaristia dominical, porque é que as pessoas se afastam da Igreja e das vivências cristãs", afirmou. Para João Carrilho, essa matéria "deve fazer pensar todos quantos estão dentro de uma Irmandade como é o caso da Irmandade da Misericórdia de Campo Maior que, à semelhança das restantes que existem no nosso país, são demasiado importantes estas vivências para podermos deixar de participar e de intervir, e procurar que os nossos irmãos mais pobres possam atingir níveis e a qualidade de vida que nós temos", referiu, o qual revelou que o papel da Misericórdia pasa por fazer com que todos os tenham uma qualidade de vida inferior "possam atingir os patamares pelo menos iguais aos nossos e se possível superá-los. É para isso que nós temos trabalhado e é sobre esse ponto de vista que nós iremos também trabalhar no futuro. Portanto, este saber de experiências feitas e de muita reflexão deve respeitar o princípio do destino universal dos bens", reconheceu João Carrilho

Gerir uma Misericórdia

   .Hoje em dia, as Misericórdias são, quiçá, as instituições de maior complexidade da sociedade portuguesa, porque a natureza humana é, desde logo, bastante complexa. "Uma vez que as Misericórdias existem para toda a gente e para todos os cidadãos, desde logo, a complexidade da gestão resulta do facto de procurarmos satisfazer todos aqueles que necessitam do nosso apoio e que por vezes, nem têm disponibilidade mental, outras vezes não têm conhecimento, outras vezes não dispõem de informação e outros recusarão. Enfim, há toda uma série de contingências que levam a que a organização da Misericórdia seja uma organização bastante complexa", reconheceu João Carrilho. Em primeiro lugar, para gerir uma Misericórdia é preciso ter presente a sua doutrina e, em segundo lugar, deve-se ter consciência da sua complexidade, das envolvências e da multiplicidade de acções que é necessário implementar. "Deve-se concretizar no dia-a-dia e ter disponibilidade espiritual e física para se dedicar a estas questões que dizem respeito à gestão de uma Misericórdia assim como é necessário ter uma sensibilidade social especial, é necessário também muito estudo, muita atenção à realidade social e à evolução das sociedades e, por isso mesmo, neste contexto é preciso ter muita análise, muito poder de síntese e é preciso também haver capacidade de decisão", revelou o provedor demissionário da SCMCM, onde acrescentou que "hoje em dia, a prática das acções que é necesário organizar no dia-a-dia está muito longe daquilo a que determinada altura se chamou de ´caridadezinha´ e os ´meus pobrezinhos´. Os pobres não são meus nem da Misericórdia me pertence e este discurso está já perfeitamente descontextualizado e está muito longe da realidade, porque nós estamos a falar de cidadãos com direitos individuais onde a liberdade individual é um direito inalienável, o qual se encontra consagrado, desde logo, na Constituição da República Portugesa, assim como em todos os tratados internacionais. é necessário ter em atenção que nós estamos a falar de população da qual nós não somos tutores nem o devemos ser. Não podemos ter uma política paternalista, não devemos ter uma política de protecção para além dos limites que as pessoas nos encarregam e, portanto, os direitos das pessoas por vezes chocam uns com os outros dentro da própria instituição e este ponto de equilíbrio é muito difícil de encontrar", disse. Os corpos gerentes têm procurado que a Misericórdia de Campo Maior funcione com os seus próprios recursos que a comunidade contém, assim como a sociedade e a União Europeia. Enfim, existe toda uma série de recursos para além dos recursos humanos que são basicamente locais e existem os recursos financeiros que têm que ser procurados no dia-a-dia para permitir não só consolidar as actividades que já estão no terreno há muito tempo, como ter também capacidade de inovação e de introdução de novas tecnologias ao serviço do homem e do cidadão de forma a melhorar o seu nível e a sua qualidade de vida. João Carrilho admitiu que isso "é uma busca permanente do dia-a-dia de procurar valorizar e aumentar o património e de forma a conseguirmos com os recursos patrimoniais, humanos e financeiros que dispomos que os cidadãos possam ser consolidados os que já estão e que se possam iniciar novos cidadãos, porque temos de ter a consciência de que à medida que terminamos de implementar um determinado serviço, há uma franja de pessoas que fica com algumas necessidades por satisfazer. Portanto, todos os dias nós temos de pensar nas pessoas que apesar do nosso esforço nós não conseguimos chegar até elas e que estão em sofrimento numa situação de pobreza e de exclusão, nesse caso, são necessárias novas respostas", frisou, o qual acrescentou que "nós temos sempre que consolidar numa perspectiva de por vezes transformar aquilo que pensaríamos que já tivesse consolidado.
   Ao longo de quase três décadas com dirigentes das Misericórdias, a SCMCM aumentou significativamente o património, tendo sido alienadas algumas coisas pequenas e insignificantes, como também se valorizou em muito todo o património da Misericórdia, quer do património urbano, quer o património rural e o património financeiro. "Tudo isso foi suficientemente valorizado assim que conseguiram ter recursos para ir ampliando as actividades da Misericórdia até ao ponto em que estamos de uma forma sustentada e sustentável, porque o ponto em que nós chegámos até ao momento a Misericórdia já demonstrou que tem recursos e tem capacidades não só de manter o que já está construído, como também ampliar as suas actividades em função das necessidades sociais da nossa comunidade campomaiorense", apontou João Carrilho. Em relação à questão financeira, João Carrilho admite que "a Misericórdia de Campo Maior tem uma situação financeira o mais saudável possível, tem uma situação financeira invejável e a comprovar tal facto nós podemos dizer com toda a satisfação que todas as contas da Misericórdia de Campo Maior estão visadas pelos serviço do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, para além de há uns anos atrás ter passado uma auditoria na qual a Misericórdia passou sem mácula. A Santa Casa tem sido alvo de inspecções por parte dos serviços da Segurança Social e "nós, hoje, com todo este acompanhamento que tem sido feito e bem sob o meu ponto de vista pelo ministério da Tutela, nós som,os hoje uma referência organizacional para todo o país e é com satisfação que nós assistimos com muita frequência a cidadãos que terminaram os seus cursos e que desejam obter níveis de qualificação a serem encaminhados para a Misericórdia de campo Maior para estudarem, analisarem e para se formarem sob o ponto de vista organizativo, quer sob o ponto de vista funcional, porque, de facto, os serviços que nós temos sõ uma referência reconhecida não só a nível local como a nível regional e nacional. Portanto,, é frequente nós termos visitas de outras instituições para ver como é que a Misericórdia está organizada e para aí, colher alguns benefícios", afirmou João Carrilho.

Projecto futuros

   A Misericórdia tem em vista uma nova residência na Quinta de São Pedro para acolher especialmente casais e cidadãos com elevado grau de autonomia que possam estar em apartamentos do tipo T1 e T= com uma qualidade superior. Este projecto será destinado para uma franja de cidadãos com um maior poder de compra, de modo a que os mesmos possam pagar serviços, sendo que os mesmos não teriam capacidade para pagar através de pensões sociais, mas com uma qualidade de serviços semelhante quer para os mais pobres quer para os mais ricos. "Dentro do princípio da solidariedade universal, os que mais têm terão que pagar pelos que menos têm, porque nós somos uma instituição que tem por missão apresentar o instrumento ao serviço da comunidade e tem de promover esta solidariedade. Portanto, terá de conseguir obter recursos que paguem pelos mesmos serviços os que mais podem a favor daqueles que menos podem", adiantou João Carrilho.
   A SCMCM deixou ainda no ar um projecto que se refere a uma instalação de cuidados continuados, sendo que é um projecto que está ainda numa fase inicial. "Existe uma dificuldade intrínseca para levar por diante esse projecto, porque aquilo que o Estado paga não é suficiente para os serviços prestados e, portanto, o edifício do antigo hospital está previsto ampliar para uma unidade de cuidados continuados. Temos também previsto remodelar o Centro Comunitário de Ouguela e fazer o aproveitamento do Casarão da Comunidade Terapêutica numa perspectiva de turismo social ligado à protecção do ambiente, uma vez que se enquadra na Rede Natura", referiu João Carrilho. Existem ainda dois projectos que são estruturantes para a comunidade concelhia, os quais são dedicados à infância. A Única creche existente em Campo Maior pertence à Misericórdia local e tem capacidade para 35 crianças. Anualmente, nascem cerca de 89 crianças e, como as crianças passam aproximadamente três anos em creche, "para acolher todas as crianças nós necessitaríamos de ter 240 lugares em creche e, portanto, nós estamos muito longe dessa meta", frisou João Carrilho, onde adiantou que a SCMCM deixou escapar "um projecto de uma nova creche, sendo que a nova creche se impõe cada vez mais até porque o jardim-de-infância está a perder frequência com as novas políticas públicas para o ensino pré-escolar e básico. Portanto, a instituição terá de se adaptar a esta nova realidade, sendo que a mesma se procurou adaptar e vai no caminho de construir uma nova creche com cerca do dobro da capacidade actual creche de modo a dar resposta às famílias campomaiorenses".
   Na opinião de João Carrilho, os portugueses têm "um problema grave com o acolhimento residencial aos doentes de Alzheimer, sendo que não existe praticamente resposta nenhuma em Portugal. E estima-se que exista à volta de 70 mil doentes de Alzheimer em Portugal, os quais estão nas suas residências, ou estão perdidos pelos hospitais, ou estão a cargo da família. Porém, não existe nenhumas entidades especializadas para doentes de Alzheimer", revelou, o qual avançou que "A Misericórdia de Campo Maior foi desafiada para implementar uma unidade de cuidados continuados para doentes de Alzheimer, sendo que essa unidade é uma tecnologia alemã e que estão adiantados os contactos com esse grupo, possibilitando, dessa forma, a instalação de uma unidade de cuidados continuados de doentes de Alzheimer. Tudo isto só é possível, porque foi possível fazer uma gestão criteriosa, uma gestão cuidada dos recursos da instituição, valorizando o seu património de forma termos, neste momento, recursos económicos e financeiros disponíveis para no abalançarmos a estes projectos de futuro". João Carrilho considera que a SCMCM "tem um património invejável e muito valorizado, sendo que tem um suporte financeiro invejável, o que permite encarar a possibilidade de fazer e de concretizar estes projectos de futuro", assegurou.

União das Misericórdias

   Durante a entrevista, o provedor demissionário fez uma divisão da União das Misericórdias Portuguesas (UMP) em três partes, sendo que esse serviço nasceu em 1976 por iniciativa do então provedor da Misericórdia de Viseu, o padre Virgílio Lopes, contando com o apoio das Misericórdias do distrito de Portalegre. "Isto foi um período de grande dinamismo e de grande apoio às Misericórdias, o qual durou quinze anos", reconheceu João Carrilho. A UMP prestou um serviço de tal maneira significativo que hoje as Misericórdias são um reflexo desses quinze anos de adopção por parte do pároco Virgílio Lopes. Ainda assim, a SCMCM teve quinze anos consecutivos em que a situação se inverteu por completo, onde João Carrilho referiu que aborda essa questão "com mágoa, porque eu fui dirigente nacional neste segundos quinze anos, dos quais 6 ou 8 anos eu tive responsabilidades directivas. Infelizmente, nós assistimos a uma reunião significativa, sendo que deixou de haver a acção das Misericórdias. Aquele espírito que o pároco Virgílio Lopes mantinha desapareceu e, portanto, a União deixou de prestar aquele apoio fundamental, quer em termos operativos quer em termos funcionalidade, assim como em termos de acompanhar as misericórdias para ser o porta-voz das misericórdias para o exterior", apontou. Contudo, foi-se perdendo capacidade de diálogo ao longo desse período de tempo e, neste momento, João Carrilho considera que está co dificuldade em compreender se será positivo existir a União das Misericórdias tal como ela se encontra instaurada, " na minha opinião, a situação actual é de uma intervenção que tem como consequência sistemática o prejuízo que advém para as Misericórdias", sublinhou.
   Para o fim da entrevista, João Carrilho avançou que "muitos dirigentes das misericórdias constatamos que aqueles que estão hoje instalados nos órgãos sociais das misericórdias não têm qualquer capacidade de diálogo com nenhuma entidade com as quais nós temos relacionamento, desde logo, e em priemira instância, com a conferência episcopal portuguesa a qual é fundamental na definição da natureza jurídica das misericórdias portuguesas", tendo anunciado que, até ao momento, "não há nenhum diálogo entre a União das Misericórdias e a Conferência Episcopal Portuguesa sobre isso. Portanto, a Conferência episcopal tomou a inixciativa isoladamente e, desde logo, não é bom porque denota uma falta de diálogo e, portanto, não é positivo sob esse ponto de vista", divulgou. A própria Conferência Episcopal tomou a iniciativa de propor à santa Sé um projecto legislativo no âmbito do direito canónico sobre a natureza jurídica das Misericórdias. Ao longo deste anos, a UMP perdeu por completo a capacidade de diálogo com o Governo, sendo que no sector da saúde as comparticipações e as imposições legais sobre o funcionamento das Unidades de saúde são estabelecidas unilateralmente pelo Ministério da Saúde. "Com este Governo, nós assistimos à denúncia unilateral de um protocolo em que havia entre a União das Misericórdias e o Ministério da saúde e mais nenhum foi celebrado. Portanto, hoje a intervenção da União das Misericórdias ficou prejudicada através do protocolo, porque o Ministério da saúde denunciou e não existe nenhum instrumento que o renha substituído", recordou, não esquecendo de referir que "na área da saúde não há diálogo da União das Misericórdias com o Ministério da saúde. Por outro lado, na área da educação do ensino pré-escolar todas as terminações são impostas por despachos, nomeadamente do secretário de estado que está encarregue desta área de ensino até às comparticipações que são afixadas anualmente pelo Governo de forma unilateral. Acerca desta questão, João Carrilho salientou que durante este ano de 2007 "o funcionamento da Acção Social resultava de protocolos anuais celebrados entre a União das Misericórdias Portuguesas e o Governo, sendo que esse Ministério fixou pela primeira vez unilateralmente condições em que as misericórdias iriam prestar serviços até às comparticipações sem qualquer intervenção da União das Misericórdias", apontou João Carrilho.
   O Governo está, de resto, a tentar a negociar a transferência de competências com a Associação Municipal de Municípios na área da Acção Social, da Saúde e da Educação, pois são áreas em que as Misericórdias intervêm e muito em Portugal. "Decorre uma negociação entre o Governo a associação Municipal de Municípios como os que estão na União das Misericórdias, ou seja, não têm nenhuma capacidade de diálogo nem estão a intervir no processo o qual irá ter consequências nas vivências e na organização das misericórdias", apontou João Carrilho sobre esse aspecto, onde sugeriu que as Misericórdias devem reflectir no seu interior e tomar posse da União das Misericórdias Portuguesas de forma a que esta instituição passe a veicular os seus pontos de vista e que passe a intervir em seu nome junto das entidades e das instituições com as quais a Misericórdia de campo Maior se tem de relacionar, as quais são, fundamentalmente, a Conferência Episcopal, o Governo, a Assembleia da República e a Associação Municipal de Municípios.

   O provedor demissionário da SCMCM encerrou o seu discurso referindo que caso não exista essa capacidade de diálogo, "as misericórdias continuarão a assistir ao que estamos a assistir no dia-a-dia à criação de múltiplas e diversificadas dificuldades que complicam ainda muito mais a gestão e a administração das Misericórdias de Portugal", concluiu o provedor demissionário da Santa Casa da Misericórdia de Campo Maior, João Carrilho.

                                                                                                                                           Manuel Garcia